
Quarteto de Cordas da UFF

É sabido que o século XX foi um período de extremas mudanças para a humanidade. Desde impérios ruindo, revoluções políticas, duas guerras mundiais até as revoluções no âmbito artístico e cultural. A música de concerto jamais esteve inerte a estas rápidas mudanças da existência humana. Por não haver um consenso absoluto sobre a definição de “modernismo musical”, vamos considerar o período da década de 1890 até meados do século XX.
Nessa efervescência criativa e estética, a música ocidental experimentava o “tonalismo expandido” de Richard Wagner em suas óperas e nas sinfonias de Gustav Mahler. Observou-se várias ampliações dessa estética musical na obra do austríaco Arnold Schoenberg (precursor do atonalismo e o dodecafonismo) e dos franceses Claude Debussy e Maurice Ravel que buscaram uma música mais voltada para a transmissão de sensações e memórias (assim como nas artes visuais com Manet, Monet, Van Gogh) do que com o rigor da técnica composicional contrapontística.
Nesse período, o Brasil vivenciou uma busca por uma arte “eminentemente nacional” que fugisse das matrizes europeias. Hoje poderíamos intitular de “atitude decolonial” com a inserção de aspectos culturais dos povos originários e dos africanos escravizados nas criações artísticas deste período. A figura de Heitor Villa Lobos foi emblemática neste sentido. Após a sua participação na Semana de Arte Moderna em 1922, ele seguiu para a Paris para apresentar suas criações, ainda influenciadas pelas tendências da música europeia, embora já sinalizasse uma busca em retratar o Brasil através de suas várias raízes culturais resultantes da formação de sua população hibrida.
Nesse sentido, o programa começa com uma obra de Stephan Koncz (n. 1984) intitulada A New Satiesfaction inspirada na Gymnopedie n.1 do compositor francês Erik Satie (1866-1935), composta e publicada em 1888. Esta obra é uma releitura de uma peça modernista com uma linguagem mais contemporânea, com elementos minimalistas que ambientam a famosa melodia da obra de Satie, escrita originalmente para piano.
Seguimos com o Quarteto n.º1 de Heitor Villa-Lobos, composto em 1915 na cidade de Nova Friburgo. Esta obra foi concebida no formato de uma suíte com seis movimentos. O movimento final remete a um personagem icônico da tradição oral brasileira: o Saci Pererê. Villa-lobos sugere que esse movimento seja uma descrição sonora do Saci, pulando com uma perna só, com um cachimbo na boca e pegando as pessoas de surpresa com suas travessuras. Nesta obra, apesar da estrutura ser mais tradicional, observa-se já uma busca de sensações e impressões que podem ser semelhantes às sonoridades encontradas em algumas obras francesas do mesmo período.
O programa encerra-se com o único quarteto composto por Maurice Ravel em 1903, quando tinha 28 anos. O Quarteto de cordas em Fá Maior foi estreado em Paris no ano seguinte, e segue como modelo o quarteto do seu conterrâneo, Claude Debussy, composto 10 anos antes. A peça foi dedicada ao prof. Gabriel Fauré, que inclusive nunca tinha escrito um quarteto de cordas, até receber a dedicatória do dileto aluno e, se encorajar a encarar o gênero.
Debussy e Ravel sempre tiveram opiniões estético-musicais bem divergentes, mas curiosamente, Debussy escreveu uma carta para Ravel manifestando sua admiração pela obra. A peça segue a forma tradicional, com quatro movimentos. O primeiro movimento apresenta dois temas contrastantes. O primeiro tema é executado por todos os quatro instrumentos de maneira diluída. Já o segundo tema, é apresentado pelo primeiro violino e pela viola. O segundo movimento inova ao ser introduzido pelo quarteto, tocando todos juntos em pizzicato. O terceiro movimento é lento, introspectivo e o último é intenso e com um final apoteótico.
Tomaz Soares, agosto 2025
Programa
Stephan KONCZ (n. 1984)
A New Satiesfaction para Quarteto de Cordas
Inspirada na Gymnopedie nº. 1 de Erik Satie.
Heitor VILLA-LOBOS (1887-1959)
Quarteto de cordas n° 1
I. Cantilena (Andante)
II. Brincadeira (Allegretto scherzando)
III. Canto lírico (Moderato)
IV. Cançoneta (Andantino quasi allegretto)
V. Melancolia (Lento)
VI. Saltando como um Saci (Allegro)
Maurice RAVEL (1875-1937)
Quarteto de cordas em Fá Maior
I. Allegro moderato – très doux
II. Assez vif – très rythmé
III. Très lent
IV. Vif et agité
Quarteto de Cordas da UFF
Tomaz Soares, 1º violino
Ubiratã Rodrigues, 2º violino
Clara Santos, viola
Glenda Carvalho, violoncelo
19 de Agosto de 2025
Terça | 19h
Teatro da UFF
Rua Miguel de Frias, 9 – Icaraí – Niterói
Ingressos: R$ 30 (inteira) – R$ 15 (meia)
Canais de venda: Guichê Web e Bilheteria
Classificação Indicativa: livre