O final do século XIX foi um período proeminente para as artes. As propostas de identidade cultural de cada país começam a ganhar força e os ideais nacionalistas na música de concerto aparecem através de citações de melodias populares, inspirados em lendas regionais e no desejo de construir uma identidade musical independente das culturas, até então, predominantes.

No concerto Páscoa e Variações Sonoras, teremos a oportunidade de ouvir três grandes compositores representantes deste período. Nikolay Rimsky-Korsakov e Alexander Borodin são dois membros do grupo “Os Cinco”, o conhecido grupo de compositores russos que levaram em suas composições elementos tradicionais da cultura russa, distanciando-se dos padrões impostos na música europeia. Deste grupo faziam parte, ainda, os compositores Mily Balakirev , César Cui e Modest Mussorgsky. No Reino Unido, Edward William Elgar trabalhava suas composições fortemente influenciado pela música da Europa continental, sendo considerado o principal compositor inglês do período.

Na abertura do programa, temos Nikolai A. Rimsky-Korsakov (1844 – 1908), compositor, professor e editor, mestre em grandes orquestrações, destacando as composições Capricho Espanhol, Scheherazade e A Grande Páscoa Russa, a obra que ouviremos hoje. Dedicada às memórias de Mussorgsky e Borodin, a peça têm suas melodias baseadas em uma coleção de antigos cantos litúrgicos ortodoxos russos, chamados Obikhod . A introdução, longa e lenta, se enche de cores sombrias que parecem representar o Santo Sepulcro, que será iluminado no momento da ressurreição. A obra vai confrontando a história bíblica com as atuais celebrações da Páscoa: a alegria das pessoas no feriado e a religiosidade. Korsakov, em sua autobiografia, disse que estava ansioso para reproduzir “o lado lendário e pagão do feriado, a transição da noite sombria e misteriosa do sábado da Paixão para a alegria pagã-religiosa desenfreada na manhã do domingo de Páscoa.”.

Alexander Borodin (1833 – 1887), filho ilegítimo do príncipe Luka Gedevanishvili, teve sua paternidade atribuída a um servo do nobre, Porfiry Borodin. Quando criança teve aulas de piano, mas sua educação foi direcionada às ciências. Formado em medicina, dedicou-se quase integralmente à química, escrevendo muitos tratados científicos e realizando muitas descobertas. Foi professor de química orgânica na Academia Militar de São Petersburgo e fundou uma escola de medicina para mulheres. Considerava-se apenas “um compositor aos domingos”. De Borodin, a orquestra interpreta o poema sinfônico Nas Estepes da Ásia Central.

Poemas sinfônicos são obras de caráter programático, em um movimento, que evocam uma narrativa, cena ou ideia, como se fosse a descrição de um quadro. O compositor descreve seu poema sinfônico da seguinte forma: “No silêncio das monótonas estepes da Ásia Central ouve-se o som pouco familiar de uma canção russa. Vinda de longe, ouvimos a aproximação de cavalos e camelos, assim como as notas estranhas e melancólicas de uma melodia oriental. Uma caravana aproxima-se, escoltada por soldados russos, e segue com segurança o seu caminho através do imenso deserto. Desaparece lentamente. As notas das melodias russa e asiática juntam-se numa harmonia comum, que se desvanece à medida que a caravana desaparece na distância.”.  A obra foi encomendada pelo czar Alexandre II, para celebrar a expansão russa na Ásia Central, incluindo áreas que hoje fazem parte do Cazaquistão, Uzbequistão e Turcomenistão.

Encerrando o concerto, temos, de Edward William Elgar (1857–1934), a obra Variações Enigma. Elgar aprendeu piano, órgão e violino com seu pai, que era dono de loja de música e organista de igreja. Este compositor era basicamente um autodidata e aos 16 anos se tornou um músico autônomo e, durante toda sua vida, nunca teve um emprego fixo. Regeu bandas locais, ensinou e compôs, até seu casamento com Caroline Alice Roberts, romancista e filha de um oficial do exército britânico. Elgar trabalhou para atingir o sucesso até seus quarenta anos, quando, depois de uma série de trabalhos menos bem-sucedidos, a sua Variações Enigma, juntamente com as obras Pompa e Circunstância e Concerto para Violoncelo em Mi menor, Op. 85, lhe renderam reconhecimento mundial e atemporal.

Enigma passou a se referir à peça inteira, embora o compositor inicialmente pretendesse que se referisse apenas ao tema em si. Na verdade, mais de um enigma está associado às variações da peça. Cada uma das 14 variações está ligada a um amigo ou ente querido específico do compositor, cujas identidades Elgar codifica na partitura usando apenas iniciais. No entanto, em nota para a estreia, o compositor sugeriu um enigma maior: “Seu ‘dito obscuro’ deve ser deixado sem adivinhação, e eu aviso que a conexão aparente entre as Variações e o Tema é muitas vezes da mais leve textura; além disso, através de todo o conjunto, outro tema maior ‘vai’, mas não é tocado – então o tema principal nunca aparece.”. Encontraremos as chaves para desvendar esse enigma?

Bom concerto!

Deivison Branco
Comissão Artística OSN UFF 2025/26

Programa 

Nikolai A. Rimsky-Korsakov (1844 – 1908)
A Grande Páscoa Russa (1887-88)  

Alexander Borodin (1833 – 1887)
Nas Estepes da Asia Central (1880)  

Edward William Elgar (1857-1934)
Variações Enigma op. 36 (1899)
I: Caroline Alice Elgar (esposa do compositor)
II: Hew David Steuart-Powell (pianista)
III: Richard Baxter Townshend (ator amador)
IV: William Meath Baker (cavalheiro country)
V: Richard Penrose Arnold (filho do poeta Matthew Arnold)
VI: Isabel Fitton (aluna de viola de Elgar)
VII: Arthur Troyte Griffth (aluno de Elgar)
VIII: Winifrid Norbury (padroeira da música)
IX: A. J. Jaeger (amigo mais próximo de Elgar “Nimrod”)
X: Dorabella Penny (parente de Townshend e Baker)
XI: George R. Sinclair (organista)
XII: Basil G. Nevinson (violoncelista)
XIII: Helen Weaver (ex-noiva de Elgar)
XIV: Auto-retrato do Compositor

13 de Abril de 2025
Domingo | 10h30
Cine Arte UFF
Rua Miguel de Frias, 9 – Icaraí – Niterói
Ingressos: R$50 (inteira) – R$ 25 (meia)
Canais de venda: Guichê Web e Bilheteria